Discorrer sobre a famigerada sensação legendada pela frase “parece que foi ontem...” pode parecer mera divagação tola, ainda mais quando se trata de um fato razoavelmente recente – aqui o lançamento do disco “Neon Ballroom” do trio australiano Silverchair – porém, tal sensação parece permear todo um levantamento de fatos transcorridos ou abortados dentro desse período, e desta forma, mais que se prender a um saudosismo óbvio, cabe refletir o quanto desses fatos afetam de alguma forma tua realidade presente, bem como o peso desse álbum após dez anos do seu lançamento.
Pois bem, antes de comentar o álbum especificamente, vou abrir um parêntese meramente pessoal e logo lançar-me ao ano de 1999, quando num final de tarde qualquer do então guri de 12 anos, reclamava do som que vinha da TV com minha irmã: - “Putz, de novo essa música chata!” e ela consentia, pois tocava novamente na MTV um refrão entediante “We’ll make up to you in the year
Creio que todos carregam consigo essas situações tão simplistas e tão pessoais que nós engendramos como marcos de algo para algo, mas que essencialmente não represente nada. Fora essas impressões pessoais um tanto quanto ditas superficialmente sobre o álbum detenho-me agora faixa a faixa do Neon Ballroom.
1 – Emotion Sickness
Faixa mais trabalhada do álbum, a qual o próprio autor, o vocalista e guitarrista Daniel Johns preveu que soaria como a mais estranha da banda até então e dessa forma foi vista a principio pelos outros ingrantes, Ben Gilies e Chris Joannou. Os arranjos de violino, violoncelo e piano intercalam as quebras de compasso que a bateria ataca junto a guitarra, que reveza em riffs e dedilhados marcantes. A letra remete às crises depressiva de Daniel, que encerra “Lessons learned”, podendo remeter aqui também como uma renúncia ao que se esperaria de um álbum do Silverchair – a emulação do grunge. Lições aprendidas, passemos a faixa seguinte.
2 – Anthem for the year 2000
A tal música que na época eu tanto achava entediante e que trazia um videoclipe em jovens se rebelavam contra a máquina do sistema transmitida pela televisão tinha uma pretensão clara da banda já pelo título. Nesta faixa, o silverchair procura realmente um hino, um peso grudento como fora com “Freak” e “Tomorrow” em álbuns anteriores. Mas agora tinha espaço para além do Power trio, havia espaço para Backing Vocals de um coral de estudantes australiano e efeitos de um teclado sintonizado com a idéia da música que emulava sirenes e vozes de políticos. Sua letra nunca foi tão atual: “Nunca pensei em viver num mundo de mentes que se acham tão certas / Nunca pensei em viver em um mundo com mentes tão pequenas”.
3- Ana’s Song (Open Fire)
O Power trio em grande sincronia, com participações pontuais do teclado de Paul Mac novamente simulando um órgão. A letra faz de Ana uma analogia a anorexia que deixou Daniel um bom tempo isolado da música e do mundo. Sua composição é basicamente uma balda é verdade, claramente identificada com o uso da estrutura- da vitalidade do refrão e até da distorção da guitarra junto ao peso da batera. Acho que qualquer moleque teve vontade na época de tocar essa música!
4- Spawn Again
Aparentemente segue a linha de Anthem, porém logo percebe-se que trata-se de uma composição mais pesada e raivosa. São os resquícios do Nirvana poderia se dizer, mas o tecladinho aqui e ali mostra que até nos momentos mais simplistas da banda neste álbum, ela evitava de alguma forma reproduzir o que já havia feito anteriormente. A letra fala do extermino de animais para consumo humano, Daniel era vegetariano engajado a denunciar o maus tratos aos animais na época, daí o peso soar tão sincero,principalmente ao vivo nessa música.
5 – Miss you Love
“It's not actually a love song at all. It's about not being in love, not finding love and not care about it”. Daniel salienta que não se trata aqui de uma mais uma baba, no caso a primeira na carreira da banda, não se tratava de uma canção de amor, e sim , de algo sobre não se apaixonar, não se interessar, de ceticismo e apatia sobre o amor. Apesar disso, a música foi recebida com muita aversão pelos antigos fans da banda e no Brasil foi responsável pela popularização da banda na época, quando tocou ate
6 . Dearest Helpless
Talvez a música mais fraca de Neon, parece apenas um exercício de tempos sincronizados pela banda, acompanhadas por um teclado pouco inspirado. A inspiração talvez venha só na letra.. “Sexo, drogas e imagem é o bastante
Para te manter viva no mundo real”.
7 – Do you feel the same
Na mesma linha da anterior, um pouco mais fácil aceitação com um refrão mais aberto. Longe de ser marcante, mas boa de tocar sem dúvida devido aos contratempos.
8 – Black Tangled Heart
O lado B do disco ganha finalmente o “brilho” cinza e soturno do álbum com seu baixo “cabeça-de-acorde” todo pontualmente Mi,e bateria junto às cordas clássicas remetando novamente à atmosfera de emotion sickness. “Talvez você se mate
Antes de eu ter uma chance
Talvez eu me apaixone
E nunca aprenda”. O vocal de Daniel finalmente consegue sobressair, embora haja alguns berros ainda, a vocalização desenvolve para o que iria desaguar no álbum seguinte Diorama. “Pegue a corda para o meu coração e caia
Você deve somente ser o último, antes de você
A ver o coração negro preso cair”.
9 . Point of View
Canção redonda e feliz no que se propõe: guitarra no overdrive, baixo pontuando e a bateria de Ben dando o peso necessário prum rockzão clássico. Destaque pro teclado no último refrão simulando um trombone bem ao fundo.
10 – Satin Sheets
That’s rock roll baby! 3 acordes, melhor estilo grunge, talvez a despedida da banda nesse gênero. Simples, redonda, berros, pancada, bater cabeça, enfim, distração pro trio tirar esse som e pro público dar uns moshes. Só pra não dizer que não era neon ballroom, o teclado aparece só pra encher com algum zumbido ao término.
11 .Paint Pastel Princess.
Os delírios do excesso de medicamentos antidepressivos de Daniel são o objeto da letra. Não procure muito significado para ela. Se detenha a ótima junção do ataque do teclado e os arranjos de cordas respondendo ao peso da batera e riffzão de guitarra. Segue a linha de Black e Emotion.
12 – Steam Will Rise
Se alguém um dia te pedir pra resumir em uma música a expressão “lado b”, conseguirá um bom entendimento ilustrativo apresentando essa faixa. Não haveria desfecho melhor para Neon Ballroom e sua estética apática. Baixo finalmente em destaque, seco, cru e pobre, não mais escondido por uma guitarra cheia ou orquestra e piano. Não. Tudo é simplista no Power trio, o solo da guitarra, o solo de bateria, tudo talvez base para improvisação ao vivo. Vai se esvaindo a canção e o álbum com escuridão de vozes dispersas como ecoando em uma catedral.
2 Comments:
Só a titulo de curiosidade pra quem gosta de mensagem subliminar, o casal apresentado na capa do album sustenta em uma das maos do home e em uma das maos da mulher um punhal. Clara referência ao ceticismo ao amor ou aos relacionamentos sociais como um todo refletido no nas canções.
Sensacional resenha do álbum. Muito bons seus termos técnicos e conhecimento musical acerca.
Deu vontade de ouvir até...
Mais uma qualidade intrínseca: crítico musical.
Muito bom!!
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