
Dos dias ordinários
Cravar um dia aparentemente ordinário como provável data marcante que perdurará por décadas até encontrar lar em um relicário em tempos empoeirados talvez seja uma pretensão tola, uma vez que todo virtuosismo de momentos triviais só desabrocha com a lápide própria do tempo e seus amigos. Porém, hoje não me restou alternativa que não fotografar por meio deste texto o que se passara em meu tal dia trivial, prevendo que ele tenha sido de fato, um daqueles que levarei no meu inconsciente, no mínimo, como formador do que serei.
Em um sábado ensolarado, com hora marcada para as 13 horas, em Aracaju a hostilidade pela proximidade do trópico é tão oportuna esse horário, em uma quadra de futebol. Era o jogo decisivo para o meu time, de radialismo , manter alguma chance no campeonato universitário. Pessoalmente o que me motivava além do prazer natural do futebol carrega consigo mesmo, era a minha projeção sobre essa partida de descarregar todas minhas frustrações e canalizar aquilo em válvula de escape.Eu entrei naquela quadra pra acabar com o jogo, pra não deixar que a vida acabasse comigo, tamanha era minha morosidade sedentária e letárgica dos últimos meses. E eu estava preparado pra acabar com o jogo. A nossa desvantagem numérica quanto ao numero de jogadores logo se refletiu no placar. Eu e meus quatro amigos não fomos páreos para nossos físicos, e tomamos um sonoro quatro a zero.
Não seria fácil lidar com a eliminação e goleada, então tomamos inteligentemente o caminho pro bar mais próximo. Secamos várias garrafas
Um pouco mais apocalíptico pensei que embora futebol eu continuasse jogando até minhas pernas obedecerem meus impulsos cerebrais e que a amizade com eles dificilmente se apagaria nos próximos anos, um ciclo havia se esgotado com o apito final daquele sábado a tarde e com o ultime brinde no bar. Em um ano, não haveria mais campeonato universitário, a válvula de escape talvez fosse só e somente só a cerveja, regando as lembranças de dias aparentemente ordinários que porém foram testemunhas de amizade e alegria de essência simples, de moleques simples, bem como o futebol, a cerveja , e os próprios dias ordinários.
2 Comments:
Pô, Bonito, Bruno... Depois de tanto tempo, o sonho universitário está se esvaindo... Vou me lembrar disso quando me encontrar com vcs lá na ufs... Mais bonita ainda a lembrança fraterna dos amigos. Belo post.
POEMETO IRÔNICO (Manuel Bandeira)
O que tu chamas tua paixão,
É tão somente curiosidade.
E os teus desejos ferventes vão
Batendo as asas na irrealidade...
Curiosidade sentimental
Do seu aroma, da sua pele.
Sonhas um ventre de alvura tal,
Que escuro o linho fique ao pé dele.
Dentre os perfumes sutis que vêm
Das suas charpas, dos seus vestidos,
Isolar tentas o odor que tem
A trama rara dos seus tecidos.
Encanto a encanto, toda a prevês.
Afagos longos, carinhos sábios,
Carícias lentas, de uma maciez
Que se diriam feitas por lábios...
Tu te perguntas, curioso, quais
Serão seus gestos, balbuciamento,
Quando descerdes nas espirais
Deslumbradoras do esquecimento...
E acima disso, buscas saber
Os seus instintos, suas tendências...
Espiar-lhe na alma por conhecer
O que há sincero nas aparências.
E os teus desejos ferventes vão
Batendo as asas na irrealidade...
O que tu chamas tua paixão
É tão-somente curiosidade.
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