Siga la pelota
Havia tempo em que o saudosismo não vinha ao cais, costa
banhada por todo presente, por todo realismo cotidiano. Eis que sou
surpreendido por uma nostalgia sem sentido, justificada apenas pela lembrança
de dias sem grandes temores. Se não havia grandes deleites, fantasmas também
não escondiam-se à espreita. Aqueles primeiros dias de 2006 vagam nas
entrelinhas da minha consciência agora, clara evidência da necessidade do suave
marasmo, da doce companhia do acaso nas caminhadas ao trabalho, no ônibus, no
caminho à faculdade. Estes são dias desleais.
As canções que me blindavam nos itinerários urbanos; o
crepúsculo boêmio no centro da cidade concomitante ao fechamento lúgubre de
cada estabelecimento comercial ao fim de mais uma jornada trabalhista; as
viagens nos transportes públicos, observando construção de vultosa ponte que
ligava o nada a lugar nenhum, bem como a aproximação de belas ninfetas efêmeras
em suas belezas e aparições. Acidentes fortuitos que permeavam momentos banais
que eu jamais poderia cogitar serem objetos de nostalgia seis anos depois. Nada
de relevante havia ali, a não ser a corrida contra o tempo para se acomodar
frente a um televisor para mais um jogo de Copa do Mundo. E como esse vazio de
propósito me preenchia de paz e exultação sem eu mesmo supor.
Fico feliz de ter deixado de lado a incessante nostalgia que
sempre me acompanhou desde a infância, muitas vezes nostalgia de coisas que nem
mesmo vivi. Logo, essa visita inesperada desse sentimento de alguma forma
conforta esses dias assíncronos e cinzas. Em referência à metáfora
futebolística, é como ser o meio-campo armador de um time estruturado dentro e
fora das quatro linhas, estar no auge físico e técnico, receber a bola limpa e
com espaço, mas simplesmente nada conseguir produzir por falta de criatividade,
alegria, ousadia. Assim transcorre esses dias: sem brilho, sem criatividade
oriunda da falta de pretensão daquelas manhãs e tardes lúdicas e urbanas.
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