domingo, novembro 09, 2008


Dos dias ordinários


Cravar um dia aparentemente ordinário como provável data marcante que perdurará por décadas até encontrar lar em um relicário em tempos empoeirados talvez seja uma pretensão tola, uma vez que todo virtuosismo de momentos triviais só desabrocha com a lápide própria do tempo e seus amigos. Porém, hoje não me restou alternativa que não fotografar por meio deste texto o que se passara em meu tal dia trivial, prevendo que ele tenha sido de fato, um daqueles que levarei no meu inconsciente, no mínimo, como formador do que serei.

Em um sábado ensolarado, com hora marcada para as 13 horas, em Aracaju a hostilidade pela proximidade do trópico é tão oportuna esse horário, em uma quadra de futebol. Era o jogo decisivo para o meu time, de radialismo , manter alguma chance no campeonato universitário. Pessoalmente o que me motivava além do prazer natural do futebol carrega consigo mesmo, era a minha projeção sobre essa partida de descarregar todas minhas frustrações e canalizar aquilo em válvula de escape.Eu entrei naquela quadra pra acabar com o jogo, pra não deixar que a vida acabasse comigo, tamanha era minha morosidade sedentária e letárgica dos últimos meses. E eu estava preparado pra acabar com o jogo. A nossa desvantagem numérica quanto ao numero de jogadores logo se refletiu no placar. Eu e meus quatro amigos não fomos páreos para nossos físicos, e tomamos um sonoro quatro a zero.

Não seria fácil lidar com a eliminação e goleada, então tomamos inteligentemente o caminho pro bar mais próximo. Secamos várias garrafas em minutos. E em minutos também deu a hora do pessoal tomar estrada. E durante aquele breve ritual de despedida, começara em mim uma já conhecida sensação de nostalgia que só fora se desenhar quando, ao chegar em casa e passado algum tempo, vi as 5 camisas estendidas no varal lado a lado, que minha mãe havia lavado. Diante daquele varal lembrei que ao menos dois dos colegas do time já estariam formados no próximo ano, e que eu e mais dois estaríamos prestes a nos formar também e que a universidade enquanto aquele sonho midiático norte americano de consumação dos festejos, um grande clube e uma grande festa estaria a se esvair.

Um pouco mais apocalíptico pensei que embora futebol eu continuasse jogando até minhas pernas obedecerem meus impulsos cerebrais e que a amizade com eles dificilmente se apagaria nos próximos anos, um ciclo havia se esgotado com o apito final daquele sábado a tarde e com o ultime brinde no bar. Em um ano, não haveria mais campeonato universitário, a válvula de escape talvez fosse só e somente só a cerveja, regando as lembranças de dias aparentemente ordinários que porém foram testemunhas de amizade e alegria de essência simples, de moleques simples, bem como o futebol, a cerveja , e os próprios dias ordinários.